Não tinha expectativa alguma
sobre Noé, vi o trailer uma vez somente, mas em se tratando de uma obra de
Darren Aronofsky, eu já aguardava por um blockbuster não convencional, pois narrar a
dolorosa missão de um protagonista e discutir a moral de um ser complexo cheio de conflitos, parece mesmo um trabalho para o cineasta. Acredito eu, este foi o motivo maior que levou Aronofsky a comandar esta que é a sua primeira
produção milionária.
Noé (Noah, 2014) é antes de tudo,
um drama psicológico, um épico com toques de fantasia, e tem muito pouco de filme
bíblico. Russell Crowe – numa interpretação notável e que exigiu muito mais nuances
do ator que em Gladiador - interpreta Noé, homem que recebe de Deus a missão
de salvar todos os animais de um dilúvio iminente. Em uma de suas visões, Noé
nota que os humanos são castigados e entende que ninguém, além dos integrantes
de sua família, deve ser posto na Arca. Para ele, o Criador se arrepende de
ter criado os homens, seres destrutivos e maldosos. Em razão disso o
protagonista toma decisões controversas, questionáveis, capaz de resultar em
discussões acaloradas entre os amigos por várias semanas.
Noé foge da escória da humanidade.
A frase “O mal está em todos nós”
do início do filme, me manteve atento durante todo a projeção, já previ que
alguns personagens iam titubear entre ser bom e mau, como o imprevisível Cam (Logan Lerman) e
o próprio protagonista. No terceiro ato, Noé torna-se um ser detestável e cego
em sua obediência ao Criador, ou seja, um fanático religioso.
A parte “fantástica” do drama
épico e que lembra muito O Senhor dos Anéis
em algumas sequências, fica por conta das criaturas gigantescas de pedras, os
Guardiões, são elas que ajudam Noé a construir a Arca. A inserção das criaturas
rendem bons momentos na trama, mas parece mesmo que elas estão ali por decisão
do estúdio, com o intuito de fazer de Noé, uma obra com apelo mais comercial,
numa tentativa de vender a produção mais como fita de aventura e menos como um
filme bíblico, pois como a história confirma, obras baseadas em escritos
religiosos geram sempre polêmicas.
Noé tem boas cenas de ação, um
elenco respeitado e competente, um visual soturno impressionante, um roteiro
que, se não é perfeito em sua estrutura, é ousado ao trabalhar o psicológico
dos personagens e apimentar as discussões sobre religião, fé ou criacionismo. É enquanto todos
estão dentro da embarcação que se passam os momentos mais tensos da produção. A
cena entre Ila (Emma Watson, deslumbrante) e Noé na beira da Arca em um
instante definitivo da narrativa, é uma das passagens mais bonitas e agonizantes do
ano.
Watson brilha no épico.
Mas o filme padece em alguns
aspectos. Com um orçamento de 120 milhões, alguns efeitos visuais mereciam um
capricho maior, os animais nas sequências em que caminham para a Arca
deveriam ter mais destaque, os bichos
são mostrados sem detalhe algum e não impressiona. Logo se nota que os animais não
foram muitos priorizados nos efeitos especiais. Quanto ao elenco, o personagem de Anthony
Hopkins é o único ali que, se fosse retirado na edição final, não faria falta.
Aronofsky realizou um épico decente
para quem não esperava muito, mas fez também um blockbuster com substância.
Noé pode ter seus escorregões, mas é uma obra imperdível, polêmica, te faz
pensar e Aronofsky merece muito nosso respeito por ousar em tocar em temas
espinhosos. No entanto, ainda prefiro o cineasta conduzindo produções menores.
NOTA: 8,0
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